O dia das mulheres é celebrado a cada ano, nesse dia as mulheres saem às ruas para reclamar seus direitos, justiça e igualdade. Existem vários campos de batalha, e um central é a agricultura.

A produção agrícola foi desenvolvida principalmente por mulheres, que iniciaram os cultivos junto aos assentamentos. As campesinas continuam até hoje produzindo uma boa parte da comida nos quintais ao redor da casa. Mas seu trabalho na propriedade familiar é desvalorizado e no Brasil é considerado uma ajuda sem direito à terra ou à aposentadoria.

Fernando Lima, KAS Fortaleza 2008
Fernando Lima, KAS Fortaleza 2008
De acordo com dados da FAO, existem mais de 1,6 bilhão de mulheres rurais no mundo, a maioria delas agricultoras, que representam mais de um quarto da população mundial. Globalmente elas produzem 50% dos alimentos e 80% nos países do sul. Porém, seus direitos à terra não estão garantidos, na maioria dos casos os proprietários são homens, e apenas 20% das propriedades estão nas mãos das mulheres.

Outro elemento característico desta cultura tradicional é a clara divisão do trabalho entre os gêneros, em que as mulheres cuidam da casa (trabalhos domésticos, crianças, água…) e do lote (vegetais, frutas, plantas medicinais, manejo de pequenos animais), bem como a comercialização dos produtos na comunidade e na feira. Os homens são responsáveis pelos grandes animais, pelas culturas extensivas e seus respectivos processos de comercialização. Mesmo assim, as mulheres contribuem com seu trabalho em várias fases do cultivo, particularmente em alguns dos trabalhos mais árduos, como a colheita do feijão, do milho e outras. E ao final são elas que preparam as refeições e decidem, o que se coloca na mesa.

Portanto, a CLOC/Vía campesina defende a manutenção das práticas das mulheres como um direito à “Campanha Global pela Defesa de Sementes como Patrimônio Mundial”, e acusa a pirataria biológica, que viola os princípios da soberania alimentar. As sementes são o património da humanidade, desenvolvidas ao longo de milénios, adaptadas ao seu habitat natural e às necessidades humanas.

 

A carta final da III ENA destaca a importância da resistência dos jovens, especialmente das mulheres, que se expressam em sua participação como sujeitos políticos e defendem o direito de acesso à terra, à educação no campo e às políticas públicas de apoio à produção e comercialização. O fortalecimento das mulheres camponesas e sua presença nos movimentos agroecológicos é fundamental, por isso elas defendem o slogan “sem feminismo não há agroecologia”.

No processo de transição agroecológica, o trabalho das mulheres camponesas se torna mais visível e elas são consideradas e reconhecidas como agricultoras e cidadãs, além de serem consideradas sujeitos políticos por sua importância para a soberania alimentar. Depois de décadas de trabalho neste sentido, já não é estranho encontrar uma mulher presidente de uma associação ou de um sindicato de trabalhadores rurais. Nesse sentido, as redes agroecológicas assumem a construção de novas relações baseadas na igualdade e revalorizam seu trabalho.

Esse reconhecimento das mulheres camponesas como protagonistas dos sistemas agroalimentares locais é fundamental. As suas contribuições na conservação das sementes e suas atividades agrícolas são de maior utilidade humana, social e ambiental. Elas mantem o conhecimento das sementes, sobre a sua coleta, classificação, identificação de propriedades, armazenamento, qualidades alimentares e culinárias, e a complementação entre elas para prevenir doenças.

As protagonistas da soberania alimentar são, portanto, as mulheres camponesas, que tiveram seu enorme potencial e conhecimento da agricultura reconhecido pelas organizações de cooperação internacional na década de 1980. Mas elas estão ameaçadas pelas patentes sobre sementes nativas, que as corporações querem privatizar. As patentes dizem respeito principalmente às mulheres camponesas, que dependem delas para garantir a alimentação de suas famílias.

Para elas, a agroecologia passa de sua visão ética da justiça social e ambiental para novas relações entre gêneros, com a divisão do trabalho doméstico, da gestão da produção, sem violência, com respeito e igualdade. A autonomia e a liberdade das mulheres devem ser garantidas, com o seu direito a terra, água, sementes, e condições de comercialização. Além disso, deve ser garantido o direito da plena participação na vida social e política nas suas comunidades.

Essas questões também são destacadas como estratégia para alcançar 5 dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU: erradicação da pobreza extrema e da fome, saúde e educação de qualidade e igualdade de gênero. Isso implica o empoderamento das mulheres que são as mais atingidas pela pobreza e pela fome, nas cidades e no campo.

As mulheres campesinas – invisivéis durante muito tempo – estao aparecendo cada vez mais, lutando pelos seus direitos e mostrando o valor do seu trabalho e seus conhecimentos. Juntos os movimentos da agroecologia, da soberanía alimentar e do feminismo serão mais fortes para avançar na construção de um mundo melhor, mais igualitário e pacífico.

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