Congresso “estamos cheios!” coloca demandas para uma outra agricultura

Campanha promove evento para um intercâmbio sobre políticas agrárias na Alemanha e na Europa e a construção de uma agricultura sustentável e justa

O Congresso Agricultura, Poder e Comida foi realizado entre os dias 30/09 a 03/ 10 em Berlim, junto ao festival “Cidade, Campo e Comida”, que promove a agricultura regional e a produção artesanal de alimentos. O evento foi organizado pela campanha “Minha agricultura”, que nasceu em 2010 como resposta à reforma da política agrária da União Européia. O objetivo principal é informar sobre a política agrária na Alemanha e na Europa e coordenar ações em conjunto. A longo prazo a intenção é acompanhar a mudança da agroindústria para um sistema ecológico, mais justo para os animais de criação, a natureza e a sociedade.

A campanha “Minha agricultura” promove o intercâmbio de ativistas, produtores e consumidores. São cerca de 45 organizações das áreas de proteção ambiental, agricultura, proteção de animais, biodiversidade e cooperação para o desenvolvimento da defesa dos direitos dos consumidores.

No programa do congresso promoveram palestras, grupos de trabalho, rodas de debate e métodos interativos. Além disso, foram apresentadas experiências práticas e foi possível participar de oficinas de fabricação de pão, queijo e cerveja. A feira em torno do local do evento e no mercado, ofereceram grande diversidade de produtos artesanais da região, sobretudo comida e bebidas.

Os objetivos da campanha “Minha agricultura” nas políticas agrárias

O movimento está há seis anos realizando ações em favor de uma agricultura campesina, ecológica e mais justa, a cada ano realiza um protesto com dez mil pessoas em Berlim contra a agroindústria, a falência de pequenos agricultores, a tecnologia transgênica e agrotóxicos. São contra a orientação na exportação e o landgrabbing, que ameaçam a soberania alimentar dos países do Sul.

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Além dos protestos, estão discutindo como se pode construir uma agricultura mais regional e ecológica – com a criação de animais de forma mais humana, como se podem diminuir as desigualdades de poder global e conseguir um sistema agroalimentar mais justo. Uma medida imediata seria a regulamentação da quantidade produzida de leite e a destinação de 500 milhões de euros da subvenção de terras para o fundo da agricultura ecológica. Outras demandas são a subvenção de pequenos produtores ecológicos e artesanais – e não da grande agroindústria; incentivos para a biodiversidade – e não para as monoculturas; como no caso do biodiesel, que levou a expansão dos cultivos de milho, a redução de fertilizantes sintéticos e agrotóxicos, a proibição de transgênicos e organismos patenteados, e a promoção da agricultura ecológica.

O excesso de produção de carne e leite da Europa ameaça os produtores do Sul, especialmente os pequenos produtores de leite e porco que são armazenados na sua existência, consequência da política agrária da Comunidade Europeia, que promove a produção de leite e carne, orientada à exportação para países da África. A Alemanha é dentro da União Europeia o maior produtor de carne.

No sul, leite e carne – sobretudo restos de frangos e de porco – que não se vendem mais na UE – são exportados e colocados nos mercados a preços dumping, destruindo as economias locais e inviabilizando a produção dos agricultores africanos pela concorrência desigual. Foram colocadas diferentes demandas, principalmente a redução das exportações, que prejudicam os mercados locais no Sul, em vez de subvencioná-las. Além disso, deveriam ser pagos preços justos para produtos importados para Alemanha. Sofia Monsalve Suárez da FIAN Internacional, defendeu os direitos das agricultoras e dos agricultores à terra e recursos, que em muitos países no Sul são negados. A garantia dos direitos poderia ter efeitos positivos para uma agricultura mais justa.

Nos grupos de trabalho também foi discutida a luta pela soberania alimentar na América Latina, e na discussão final foi defendida a proibição da importação de soja do Brasil, quando for produzida em terras dos quais foram expulsas comunidades indígenas ou campesinas, como meio para evitar as expulsões, já que não se pode interferir na política interna dos países. Outro grupo discutiu a organização do movimento para a soberania alimentar na Alemanha, em relação ao segundo encontro do “Forum Europeu de Soberania Alimentar Nyéléni”, final de outubro na Rumenia.

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Feira de produtos artesanais da região

Luta pelos direitos dos animais

Também na Alemanha a pressão sobre os pequenos produtores é enorme, que tem que crescer cada vez mais com altos investimentos, ou entram em falência. Somente em 2015 foram 3.200 fazendas que tiveram que fechar. As organizações demandam incentivos e políticas para aumentar a qualidade e o preço, baixando a produção e melhorando as condições de criação para os animais.

As condições da criação de animais no regime de confinação pela indústria da carne foi tema de dois grupos de trabalho, um tema que reúne defensores de animais e ativistas por uma agricultura ecológica. Na Alemanha existem iniciativas que exigem a proibição da matança dos machos, na produção de ovos, que logo depois de nascer, eles são triturados em máquinas ou mortos com gás, por não terem valor no mercado. O consumo de carne está baixando com o auge do vegetarianismo e veganismo, que virou um movimento, mas a produção de carne continua alta e os excessos são exportados para os países do Sul, onde destroem as economias locais.

Resultados modestos nas políticas, mas avanços nas práticas agroecológicas

Representantes políticos de diferentes partidos e um representante dos criadores de porco e gado participaram de uma mesa redonda na finalização do evento.

Foi admitido por parte dos representantes que o lobby da agroindústria é poderosa e interfere em qualquer iniciativa política de deputados ou prefeituras, que intentam regularizar o mercado de terras ou mudar a política da UE, que promove a ampliação de cultivos de milho para a produção de biodiesel, que está elevando o preço das terras e contribuindo para o desgaste de solos, e as subvenções para a criação de porcos estão provocando desastres ambientais nas regiões onde são confinados.

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Mesa redonda de encerramento

No final, a avaliação do evento foi positiva, mas os avanços nos últimos anos foram considerados modestos. Entretanto, nos últimos anos se multiplicaram as iniciativas de agricultura urbana e de agricultura solidária, na qual um grupo de pessoas apoia uma família de produtores ecológicos, entre outros projetos, como as da agricultura regenerativa que foram apresentados num dos grupos de trabalho. Foram desenvolvidas novas tecnologias para incorporar adubo ao solo com plantio direto, a criação de sistemas de lagos ou a iniciativa de um agricultor que vive do apoio de um grupo de pessoas, que podem recolher nas plantações o que precisam, e o restante é levado a uma praça, onde qualquer pessoa pode se abastecer sem ter que pagar. Nasce assim uma outra forma de cultivar, de se alimentar e de viver, com experimentos de uma nova economia e uma outra agricultura, mais sustentável e justa.

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